segunda-feira, 19 de outubro de 2020

POR NOAH MACHADO :: 
Esse mês completei cinco anos de psicoterapia. Aproveitando a alegria por estar nessa jornada, gostaria de falar um pouquinho sobre tempo e a vida após um diagnóstico de depressão.

Vamos contextualizar um pouquinho o caso. Fui diagnosticado com depressão crônica há cerca de cinco anos. Era uma fase complexa, havia muitas mudanças ocorrendo e eu estava redescobrindo muito minha história pessoal. Durante dois anos, mantive os sintomas sob controle sem necessidade de tratamento psiquiátrico, mas depois fui piorando e precisei de mais ajuda. Passei por dois tratamentos com antidepressivos em 2017 e 2019/2020. Hoje faço apenas o acompanhamento psicológico. 

Você deve estar pensando: “meu deus, muito tempo tratando, Rô”. Sim, um tempinho considerável, mas estou longe de querer parar. Explico o porquê.

No consultório da terapia, o tempo é nosso. Temos um espaço seguro para falar, organizado para nos receber, acolher. E ainda que no começo a gente não consiga dizer muito, o lugar e o tempo estão ali, disponíveis para você se abrir e permitir viver esse momento de cuidado com sua saúde.

Além disso, temos um profissional, com formação e preparo para desempenhar este papel: ser o seu cuidador, acolher, conversar, guiar reflexões... Estou enfatizando essas coisas, pois vivemos numa sociedade que impõe uma organização do tempo e do trabalho que cansa, desgasta e às vezes extingue nossos momentos com nós mesmos, seja para descansar, seja para tratar da nossa saúde. 

Agir individualmente contra essa força psicossocial que nos afeta e tira nossa potência de agir e realizar as coisas não é uma tarefa simples. Se propor a viver um tratamento e seus desafios enquanto toda a loucura do mundo acontece não é fácil, e muitos de nós não conseguem sequer tentar.

Minha doença me fez sentir muitas coisas: culpa por ser quem sou, automutilação, fadiga e exaustão física, dor, desesperança, ansiedade, dificuldade pra falar em público etc. Era muita coisa mesmo. Eu não sabia o que fazer sozinho, então pedi ajuda.

No consultório da terapia tive a oportunidade de deixar a ferida ser vista para que pudéssemos saber como proceder. Precisei de paciência, pois passamos tantos anos da vida nos formando e adquirindo nossa maneira própria de nos organizarmos para lidar com o mundo, que nos esquecemos que aprender novas coisas e conhecer nossos sentimentos em um processo terapêutico pode demorar um pouco. 

E é um desafio. Colocar-se em posição de fragilidade num mundo que aprendeu a exibir um nível de bem-estar e felicidade falsos em todo o espaço social (principalmente os virtuais) é desafiador. Pois nem sempre queremos ou conseguimos enxergar e lidar com nossas sombras, mesmo que precisemos.

Mas penso que ela pode ser um meio muito útil de fortalecimento. A cada conversa, a cada desafio proposto, cada técnica que minha psicóloga me ensinou, cada crise que eu superei, ou mesmo as vezes que desisti de cessar as angústias definitivamente. Todas elas me trouxeram ferramentas pra lidar melhor comigo mesmo e com minha condição.

Eu consegui sair de um lugar horrível, de culpa e sofrimento constantes, pra um lugar de mais força pessoal, com um pouco mais de maturidade e conhecimento pra lidar com as situações, gatilhos. Além disso, precisei me respeitar e dar um tempo na vida social. Peguei uma licença no ano passado, chutei o balde, taquei um foda-se temporário pra vida acadêmica e todo o estresse que a envolve e fiquei só trabalhando e me tratando. Aprendi que autocuidado é constante e precisamos exercer a consciência todos os dias pra tentar manter os limites do saudável em nossos hábitos. 

Sigo vivendo uma vida normal, com dores e delícias, mesmo com duas doenças crônicas. E eu espero que esse texto toque alguém que passa pelo mesmo e estimule a busca por ajuda. Existem alternativas baratas no setor privado e outras que são públicas, gratuitas e de qualidade. Não passe por isso sozinhe, procure um profissional ou serviço de saúde.


:: Veja aqui algumas opções de onde buscar apoio






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